Moção de Repúdio Às Comunidades Terapêuticas e Exigência do Desfinanciamento Imediato Destas e da Potencialização da Rede Raps e Rede Suas

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Abaixo o texto da Moção de Repúdio Às Comunidades Terapêuticas e Exigência do Desfinanciamento Imediato Destas e da Potencialização da Rede Raps e Rede Suas, aprovado na 5ª Conferência Estadual de Direitos Humanos, no qual o MNU Bahia participou ativamente da construção e da aprovação.

À 5ª CONFERÊNCIA ESTADUAL DE DIREITOS HUMANOS

As delegadas e os delegados abaixo-assinados, nos termos do Regimento Interno da 5ª CEDH, vêm perante esta Plenária Final submeter à apreciação e deliberação a presente Moção, fundamentada nos Eixos 1 – “Enfrentamento das Violações e Retrocessos” e 3 – “Igualdade e Justiça Social”.

JUSTIFICATIVA

CONSIDERANDO as deliberações da 5ª Conferência Nacional de Saúde Mental (5ª CNSM, 2023), que se posicionou de forma unânime e contundente contra o financiamento e a incorporação das chamadas Comunidades Terapêuticas (CTs) nas políticas públicas;

CONSIDERANDO que as CTs não são equipamentos de saúde ou de assistência social devidamente reconhecidos, carecendo de fundamentação científica, projeto terapêutico singular e supervisão técnica adequada, configurando-se como uma grave irresponsabilidade sanitária;

CONSIDERANDO a vasta evidência documentada por pesquisas acadêmicas, relatórios de órgãos de controle, como o Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT), e denúncias do movimento antimanicomial, que expõem as CTs como instituições que perpetuam violações sistemáticas de direitos humanos, caracterizadas como “novas-velhas formas de manicômio”;

CONSIDERANDO que tais violações incluem a prática de trabalho forçado (laborterapia), condições degradantes e análogas à escravidão, isolamento, tortura, violência religiosa, LGBTIfobia e violência de gênero, constituindo-se em crimes graves;

CONSIDERANDO o caráter estruturalmente racista e classista dessas instituições, que recrutam e subjugam majoritariamente corpos negros, pobres e periféricos, aprofundando desigualdades sociais;

CONSIDERANDO que o financiamento público e a chancela estatal às CTs, como demonstrado pelo edital do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS – Aviso nº 4/2025/DEPAD/SE/MDS) que prevê a transferência de mais de R$ 169 milhões em 2025, configuram uma captura de recursos que deveriam ser destinados à consolidação da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) e do Sistema Único de Assistência Social (SUAS);

CONSIDERANDO que o Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) não reconhece as CTs como equipamentos do SUAS, e que sua manutenção na Portaria 3.088/2011, que institui a RAPS, representa um equívoco conceitual e um obstáculo à Reforma Psiquiátrica Brasileira;

CONSIDERANDO que o Estado, ao financiar e regularizar tais instituições, torna-se cúmplice e corresponsável pelas violações nelas praticadas, transformando violência privada em violência estatal;

CONSIDERANDO que o Estado é laico conforme referências da Constituição Federal de 1988 e as Comunidades Terapêuticas se constituem, comumente, em espaços conduzidos por orientações e concepções religiosas específicas;

CONSIDERANDO a Campanha Nacional contra Comunidades Terapêuticas e seus propósitos e argumentações pertinentes.

DELIBERAÇÕES E EXIGÊNCIAS
Diante do exposto, a 5ª CONFERÊNCIA ESTADUAL DE DIREITOS HUMANOS delibera e exige:

1. Pelo Desfinanciamento Imediato: A imediata suspensão de qualquer repasse de recursos públicos, federais, estaduais ou municipais, destinados direta ou indiretamente às Comunidades Terapêuticas, por meio de qualquer programa ou ministério.
2. Pela Revogação da Chancela Estatal: A revogação imediata de todos os atos normativos, editais e portarias que conferem suposta legalidade ou reconhecimento às CTs, com destaque para a revogação do Aviso nº 4/2025 do MDS e a desativação do Departamento de Entidades de Apoio e Acolhimento Atuantes em Álcool e Drogas (DEPAD).
3. Pela Desvinculação das Políticas Públicas: A retirada imediata das Comunidades Terapêuticas da Portaria GM/MS nº 3.088/2011, que institui a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), reafirmando que estes equipamentos não integram a política pública de saúde mental.
4. Pelo Fortalecimento da RAPS e do SUAS: A realocação integral dos recursos atualmente desviados para as CTs em serviços de base territorial, comunitária e laica, tais como os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS, CAPS AD), Serviços Residenciais Terapêuticos, Unidades de Acolhimento, Consultório na Rua, Centros POP, CRAS e CREAS, a luz das referências e definições do Relatório da IV Conferência Nacional Intersetorial de Saúde Mental/2010.
5. Pela Fiscalização e Fechamento: Que o Ministério da Saúde, em conjunto com os Conselhos de Saúde, determine a imediata desativação do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES) de todas as CTs cadastradas e intensifique a fiscalização sanitária para o seu fechamento.
6. Pela Atualização da Norma Sanitária: Que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) revogue urgentemente a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 29/2011, substituindo-a por norma que estabeleça critérios rígidos de segurança e direitos humanos, incompatíveis com o modelo manicomial das CTs.
7. Pela Transição Antimanicomial: A elaboração e implementação, em caráter de urgência, de um Plano Nacional de Transição Antimanicomial, conforme deliberado pela 5ª CNSM, para desmontar a estrutura de internação asilar e garantir o cuidado em liberdade.
8. Pela Redução de Danos como Paradigma: A reafirmação e implementação da Política de Redução de Danos como diretriz central e transversal das políticas sobre drogas e saúde mental, em oposição ao modelo abstencionista, moralista e proibicionista.
9. Pela desativação de Departamento/setores responsáveis pela gestão, monitoramento e apoio técnico e financeiro às Comunidades Terapêuticas, em Órgãos Públicos Federais.

PELO FIM DOS MANICÔMIOS!
PELO DESFINANCIAMENTO IMEDIATO DAS COMUNIDADES TERAPÊUTICAS!
EM DEFESA DA RAPS, DO SUS E DO SUAS! POR UMA SOCIEDADE SEM MURALHAS E COM DIREITOS HUMANOS!

Salvador, Bahia, 09 de Outubro de 2025.

 

Sobre

Movimento Negro Unificado (MNU) é uma organização pioneira na luta do Povo Negro no Brasil. Fundada no dia 18 de junho de 1978, e lançada publicamente no dia 7 de julho, deste mesmo ano, em evento nas escadarias do Teatro Municipal de São Paulo em pleno regime militar. O ato representou um marco referencial histórico na luta contra a discriminação racial no país.