*Por Talisson Vasconcellos, Militante do ENEGRECER
Nesta Quinta feira após o carnaval iniciei uma leitura libertadora, a Crítica da Razão Negra
de Achille Mbembe, e logo de início teve um trecho que me impacto muito, uma citação de
Gilles Deleuze: “Há sempre um negro, um judeu, um chinês, um grão-mongol, um ariano no
delírio”. E o que é esse delírio, fantasiado algumas vezes de assédio? Se não uma exacerbação
imaterial das dinâmicas do capitalismo patriarca exercido cotidianamente em finitos circuitos
de validação. Ou seja, o ser que se sente no direito de violar o livre arbítrio do outro por afeto
é o mesmo indivíduo que se ver inserido no sistema capitalista, que pode, estimulado pelos
desejos, realizar proezas como viajar para Cidade do Cabo por uma semana por exemplo e
ainda continuar repetindo outras finitas atitudes de não respeito a vida do outro, onde as
próprias dinâmicas do capital, em ter ou não ter grana validem as mesmas atitudes medonhas.
Pois, quando uma pessoa branca no meio do carnaval de Salvador se sente no direito de
verbalizar ofensas densas a um ambulante como Ediel, é de se repensar: Onde estamos?
No país que atitudes como essa se naturaliza. – Jamais quero morar num país assim – Ediel
afirmou que recebeu 10 reais do policial militar. O mesmo policial que poderia ter conduzido
o próprio para um outro local tranquilamente ou procura saber quem foi essa pessoa que lhe
agrediu. E se fosse ao contrário? E se Ediel estivesse com abadar e a pessoa nem tão retinta
assim estivesse no trabalho dele?
– Ediel precisa de amparo, isso é indícios de calamidade civilizatória, o ruim é saber que não
é só Ediel que foi vítima de transtorno e humilhação, mas sim uma imensa maioria preta da
população que sabe que a luta de classe é uma luta de raças, pois não vivenciamos enquanto
povo preto majoritário em salvador, obter abadas de grande valor financeiro para curti um
percurso no bloco Me Abraça ou Camaleão, por que muitos retintos nem tem tanta grana assim.
– Porém gosto de afirmar que todo retinto tem magia acumulada, e essa magia transborda
nas avenidas em todos os dias do Carnaval, maravilha.
Maravilha deveria ser o melhor sinônimo do Carnaval, pois são tantas maravilhas que nos
deparamos, que muitas vezes podemos nos ver no paraíso com uma imensidão de gente bonita
por todos os lados e artistas formidáveis de nossos gostos, multiplicando êxtases em energia
vibracional positiva. Entretendo as construções sociais conjunturais moldam seres ridículos
socialmente também, vejamos alguns integrantes do bloco as Muquiranas por exemplo, que
entende a pirraça como meio de charme. Deplorável. Comportamento genuinamente branco
fascista, pra não falar alemão e suar xenofóbico. Lastimável.
O pior que o racismo assim como os eventos carnavalescos existe e machucam muito. Muito
mesmo. Imagine saber que um parente seu está detido sendo exposto pela mídia televisiva. –
Por vezes é melhor não imaginar, já que estás pessoas tem CEP, CPF e ocupações e não estão
em condições de compra abadar, no entanto são expostos sem permissão, perpetuando a lógica
do oprimido que por vezes se encontra sem saída frente a dimensão de inserção epistemológica
atual.
Sabemos da riquíssima diversidade cultural do carnaval de Salvador, conhecemos agentes
transformadores dessa festa magnifica com mais de 60 anos de tradição que faz acontecer com
cada vez mais carinho o melhor carnaval do mundo. Seja no saudoso curto-circuito Dodô
Osmar, ou no glamuroso percurso Barra Ondina, no divino carnaval do Pelourinho e até mesmo
na folia nos bairros.
– O cortejo afro na minha singela opinião, é o ápice do carnaval de Salvador. Sendo o
carnaval historicamente conhecido no ínterim anual de festividade profana do
catolicismo, começando no dia de Reis e indo até a benevolente quarta–feira de cinzas,
período gregoriano de epifania. Assim nesta modernidade festejar sem se remeter as
torturas de nossas vítimas algozes da escravidão e todo processo de resistência pela vida
preta até aqui, não é da resiliência do povo negro. Que age contundentemente em todo
país, expandindo os alicerces de nossa cultura em desfiles com notórias belezas
exuberantes
Porém hoje ainda, infelizmente presenciamos nas mazelas herdadas pelo regime escravocrata,
atitudes nefastas, como não pagamento de cordeiros. Como é que pode alguém trabalhar
durante 6 dias em pé sendo exposto a situações constrangedoras, no sol, chuva, calor humano,
uso de tornozeleira, fatores epidemiológicos de risco e não receber míseros 360 reais, quantia
que não paga um dia no camarote de muitos.
Somos povo preto Lindo, e não abaixaremos a cabeça diante as atrocidades vulgar, desumanas.
Nossa Força vem de longe, Aqualtune vive em nossos quilombos em pleno século XXI
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